"Como pode o amor já ter acontecido e não acontecer? Esgotamento. O cérebro espremido como uma esponja. Cheio de buracos ainda húmidos ainda feridos pela presença de ideias que não existem mais. Vidasimulação, vidaprolongamento. Estado que se torna obcecante. Pensa-se nisso todo o dia. E quando os ponteiros do relógio dão a última volta pensa-se nisso toda a noite. E o tempo corre deitado ao nosso lado enquanto estamos deitados, ao nosso lado na cama em linha recta. E não nos toca. Ficamos pela primeira vez devido ao esgotamento isolados do tempo retirados do tempo formando pequenas unidades solitárias. (...) Mas o tempo. O tempo que passava, a ideia de desistir a insinuar-se, ter nas mãos uma série de fragmentos que não encaixavam uns nos outros, no fundo não ter começado não ter acabado nada. Desistir. Vou chegar sozinha ao fim da vida. A solidão cresceu dentro de mim, ocupa-me por dentro, estou presa à solidão do que procuro e não sei o que é e não vem ter comigo embora eu espere e pense, todas as noites penso antes de adormecer e enquanto penso rezo e tenho às vezes fé mas não dura o tempo suficiente. O tempo. Ir mais longe. Mesmo quando se chega ao fim. Ir mais longe, não parar nunca. Viagens em redondo como os círculos que o tempo abre e fecha nos relógios. Estou presa num relógio estou metida direita num ponteiro e quando julgo que os círculos acabam outros círculos nascem maníacos viciosos repetidos. Vão nascendo de mim. E sobre tudo isto a consciência. E o esgotamento. A noite da chegada, como que a desistir."
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* Y. K. Centeno
As Palavras Que Pena
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