domingo, 2 de maio de 2010

* Beltane


A Deusa vive em nós. E embora por vezes não possuamos esta consciência seremos sempre os seus instrumentos. Por vezes as suas armas, em tempos de guerra. Os seus lábios em tempos de amor.
Os batuques tocam ao longe. Acendem-se as fogueiras da purificação e celebra-se a Primavera do corpo. Ninguém sairá isento, começou a batalha orgiástica. E o corpo, este traidor que fala tão alto, transportando sensações e emoções que falam e arrastam langores tão fortes e mais altos que a razão. Líbido! Pecado original. Instinto promíscuo que transpira em nós, noite de desejo. Corpo com corpo. Pele com pele.. União transcendente e divina, que muitas vezes a razão chama de pecado mas que o coração apelida de encontro. E na chama da paixão encontramo-nos na união com o outro. Em cada gesto perdido a razão incerta de se atingir o auge da comunhão.
E a entrega acontece. Os corpos misturam-se, integram-se, fundem-se. Metade sensual, metade animal. Até que a chama faça eclodir a lava! Porque o corpo de uma mulher, guerreira ou sacerdotisa, é a casa do desejo. E as suas armas são um misto de perversidade incandescente e pureza que oferece ao ceder o seu corpo como guarida. E no seu corpo o refúgio.. A casa do desejo, do amor. É ali que se encontram os segredos do Universo, os mistérios que os homens anseiam por desvendar. Guerreiras. anciãs, meretrizes, virgens.. A Deusa revela-se em cada olhar, a luz do seu templo sagrado. Que desde que bem entregue é sempre explorado, bem alicerçado, levando em ondas de calor e pecado a sítios de dimensões unificadas. Calor da noite. Noites de luar, lua cheia, animal com cio à espera de ser encontrado.
Porque se o corpo fosse barreira em vez de ponte, não seria tão fulgurante o êxtase do momento em que Dois se tornam Um, regressando à forma primordial: andrógino celeste.
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Metamorfose
texto escrito numa noite de Beltane, por três amigas: Deborah Silva, Emanuela Sousa, e Margarida Morais
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Photo by Kyle Mackay