segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Star Matter



"Love gets started and next thing you know
It leaves everything else behind
Love sets fire to your schedule
And then calls an end to time


And when we're parted it's always too long
And every time you come back you come back so strong
And as soon as we can we gotta go lie down
In that place where our breath is one sound


And I was there to hear your bell
The first time it rang
And the beauty was the beauty of everything
Yeah, we are star matter from the big bang


And that love ain't far behind you
Love ain't far behind
That love ain't far behind you
Love ain't far behind
No, love ain't far behind you"

Ani Difranco

domingo, 30 de janeiro de 2011

devaneios do caminho




Observo-te enquanto dormes.
As linhas do teu rosto, corpo de desejo colado ao meu.
Tento desvender o segredo do teu sonho,
neste instante em que te sinto tão próximo.
Mas acordo, e o perto se torna distante.
A tua alma caminhante deixa o meu coração irrequieto.
Por isso viro costas e sigo o meu caminho.

Seremos enlaçadores de mundos, de estrelas,
como o fomos em tantas outras noites...
mas num outro amanhã, talvez, numa outra vida.
Por hoje serei apenas caminhante errante.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Amores Secretos



"O amor que se sente corresponde a um desejo não de dar mas de receber, amar é desejar ser amado, talvez só isso justifique a ordem de amar o próximo como a si mesmo.
Para saber quem somos temos de nos conhecer.
O conhecimento de si mesmo é a coluna estruturante - do desejo (como da Sabedoria proposta à entrada do templo de Delfos).
Conhece-te a ti mesmo.
Ao fim de tantos anos já me conheço um pouco, mas amo-me cada vez menos.
Encontro nas minhas amigas e amigos as qualidades que me faltam: força, coragem, alegria, determinação.
Não tenho nada disso.
Estou em dissolução, na pior fase, numa nigredo de que não sei sair.
Alguns julgarão que sim, que não preciso de nada e de ninguém.
Estão enganados.
Preciso muito de ajuda."


Y. K. Centeno
in Amores Secretos

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Morte de Rimbaud


I.



todos os pássaros sossegaram.
as crianças desceram das árvores, guardaram os jogos, recolheram a casa.


a noite está próxima.

levanto a cabeça e deixo a voz deambular por dentro deste silêncio de água e de estrelas.

a noite está próxima.

deixo o corpo escorregar na poeira luminosa.
acendo um cigarro, ponho-me a falar com o meu fantasma.


longe daqui, a cidade enfeitou-se com seus crimes de néon, com suas traições.
ouço hélices de barcos, motores, quando um rosto esvoaça ao alcance da mão.

a verdade é que passei a vida a fugir, de cidade em cidade, com um sussurro cortante nos lábios.
e atravessei cidades e ruas sem nome, estradas, pontes que ligam uma treva a outra treva.
caminho como sempre caminhei, dentro de mim - rasgando paisagens, sulcando mares, devorando imagens.


o absinto, esse álcool que me permitiu medir o tempo no movimento dos astros.
e vi a vida como um barco à deriva, vi esse barco tentar regressar ao porto - mas os portos são olhos enormes que vigiam os oceanos. servem para levarmos o corpo até um deles e morrer.

a noite está próxima.

vejo acenderem-se mãos voláteis, e uma sede de poços e de nomadismo.
sulco a areia que sitia as cidades para trás abandonadas.
abro fendas na memória, e a noite surge com suas cidades queimadas, desertas - e o vento... o vento cintila onde cresce o lobo que me ronda o sono.
estendo a mão, pego no revólver, mas nada acontece.


de nada me serviria inventar outra vez o rio das palavras, de nada me serviria saber a geometria exacta dos cristais, ou redesenhar o corpo e aperfeiçoa-lo.
fico assim, inerte, à beira da noite... olhando o brilho da lua jorrando águas.

o regresso nunca foi possível.
o verdadeiro fugitivo não regressa, não sabe regressar. reduz os continentes a distâncias mentais.
aprende a fala dos outros - e, por cima dele, as constelações vão esboçando o tormentoso destino dos homens.

pressinto uma sombra a envolver-me, ouço música... espirais de som subindo aos subúrbios da alma.
e acendo o lume das pirâmides, onde o tempo não foi inventado, e renego a alegria.
não semearei o meu desgosto, por onde passar.
nem as minhas traições.



II.


não consigo dormir, nunca mais.
ando de um lado para o outro, canso o corpo, enquanto a língua segrega uma saliva exterminadora.


lá fora, dentro da noite, os chacais, as hienas cercam a casa. mas o pior é este chacal que me esfarrapa as vísceras, esta hiena que me devora o sonho.
pela janela vejo a linha crepuscular da duna.
um novo corpo liberta-se do meu e caminha fora de mim - vejo-o afastar-se em direcção aos nevoeiros das cidades.
sei, nesse instante, que nenhum abraço chega para atenuar a dor da separação.
afastados, tudo o que nos resta é começar a imitar a vida um do outro.


o que dissemos perdeu o sabor e o sentido.
harrar, aden, lisboa, este silêncio... capaz de ordenar e desordenar o mundo, o canto sublime das miragens.
mas vai chegar o inverno, e a tristeza dos dias começa a zumbir à roda da cabeça.


abri a janela.
avisto uma nesga de céu limpo.
lembro-me de quando trocava um sorriso por um verso, ou um insulto.
imitávamos assim a felicidade.


o sol fulmina a memória. limpa-a da crueldade do passado.
a vida, aqui, reduz-se a efémeros passos, surdas gargalhadas, ideias que se evaporam lentamente.
enfim, o mundo não é assim tão grande...


e a vida, afinal, é como as orquídeas - reproduz-se com dificuldade.
mas estou cansado.
os olhos fecham-se-me com o peso das paixões desfeitas.
imagens, imagens que se colam ao interior das pálpebras - imagens de neve e de miséria, de cidades obsessivas, de fome e de violência, de sangue, aquedutos, de esperma, de barcos, de comboios, de gritos... talvez... talvez uma voz.


o desejo de um sol impiedoso, sobretudo enquanto dormia.


e embarquei num cargueiro, desertei em java, pensei mesmo construir uma casa.
mas não foi possível.


ainda vejo aquelas árvores cobertas de ossos luminosos, e a duna incendiada, o deserto onde posso continuar a reconstruir o universo.


escavo no coração um poço de sal, para dar de beber ao viajante que fui.
deixo o vento arrastar consigo a infindável caravana de ilusões.


e digo: que tudo se afogue na gordura das manhãs, que tudo silencie... e uma língua de fogo atinja os livros que não escreverei.



III.




os dias estão cheios de cartas e de recomendações, de amigos que partem para sempre, ou adoecem, de recados e de intrigas, de contas intermináveis, de ouro, de corpos, de fortuna e de infortúnios.
de morte, e de cães feridos a uivar à porta da desolação.


uma espécie de miséria e de orgulho, escorrem no fundo de mim. e talvez seja a mistura venenosa da miséria com o orgulho que me há-de perder...

não tenho mais nada a dizer. os poemas morreram.
fugir tornou-se uma obsessão, ou então é a melhor maneira de encenar o desespero.
bebi águas inquinadas.
vi o corpo suspenso no rebordo dos poços, o coração batendo descontrolado.


mas a morte, quando se aproxima, é uma coisa simples... vem comer à mão a cinza melodiosa dos dias.
por isso sei que, ao amanhecer, posso perguntar:
quantas áfricas murcharam na boca do amor?
quantas feras despedaçadas foram comidas ao entardecer?
quantos homens conseguiram apaziguar o relâmpago da paixão?
quantos desejos ficaram abandonados na escuridão intacta dos quartos?


a qual dos demónios me vender?
que besta suja será preciso adorar?
em que sangue contaminado mergulharei a língua?
que fogo estranho é este? que devora a beleza interior das coisas...
que mentira me poderá salvar?


uma golada de veneno e eis que se acende o talento.
o rumor precioso das sílabas. o choro e o riso.
o brilho gelado das imagens.
então, ergo o cachimbo e fumo um tempo futuro, ajeito o cinturão onde guardo o outro - e vou pelo engano das palavras.


descubro a febre, a ânsia do eterno viajante.
abro as mãos, solto as borboletas e os pássaros - que dizem ser a alma dos mortos.
um espelho onde não me reconheço. mas o pior é que nunca acreditei no que me disseram, e parti o espelho.

o azar nunca mais me largou, e também não posso dizer que os negócios me tenham corrido bem.
foi maldição, dizem.
paciência. mas não há maldição sem desejo - e eu não páro de desejar, sôfrego... capaz de arriscar a vida e a razão.
ou de matar.




IV.


um rasgão de luz sobre a pele, dormes na seiva doce das manhãs.
mas sabes que só há repouso para o sofrimento quando se entra no primeiro dia dos dias sem ninguém.
a dor, a perna amputada, a chaga viva, o sangue a latejar - o mapa da abissínia.


o sol enterra-se nas areias.
viajo, sem me mexer desta enxerga branca.
tento encontrar espaço para a lucidez do meu silêncio.
no lugar do poema coalha o ouro das geadas, e os animais são formas etéreas que se me colam ao rosto.
o que morre, quase não faz falta...


dantes ouvia o mar... bastava encostar a cabeça ao peito um do outro.
mas um homem em cujo coração se tenha concentrado toda a fúria de viver, será um homem feliz?
não sei se posso querer alguma eternidade... não sei...

o que vejo já não se pode cantar.

que horas serão dentro do meu corpo?
que mineral vermelho jorraria se golpeasse uma veia... não sei... não sei...


o que vejo já não se pode cantar.


lembro-me duma cabeça rebelde flutuando junto à janela.
mas a casa está repleta de gemidos, vai amanhecer, não me lembro de mais nada.

o que vejo já não se pode cantar.

recomeço a fuga, a última, e nela hei-de morrer de olhos abertos, atento ao mínimo rumor, ao mais pequeno gesto - atento à metamorfose do corpo que sempre recusou o aborrecimento.

o que vejo já não se pode cantar.

caminho com os braços levantados, e com a ponta dos dedos acendo o firmamento da alma.
espero que o vento passe... escuro, lento. então, entrarei nele, cintilante, leve... e desapareço.



* Al Berto


morte de rimbaud
dita em voz alta no coliseu de lisboa,
a 20 de novembro de 1996 *

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Love came here



"There is no end to this story
No final tragedy or glory
Love came here and never left

Now that my heart is open
It can't be closed or broken
love came here and never left

Now I'll have to live with loving you forever
Although our days of living life together
Of living life together are over

There's nothing here to throw away
I came to you in light of day
And love came here and never left."

Lhasa de Sela

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Deitar-me para sonhar


"(Deitar-me para sonhar não é apenas uma flor de pó nascida como uma rosa das areias do deserto e destruída por uma rajada de vento. Deitar-me para sonhar é plantar a semente do milagre e da satisfação.)
(...)
Espero pelo amante fantasma - aquele que persegue todas as mulheres, aquele com quem eu sonho, que está por detrás de cada homem - com um dedo e a cabeça a abanar: «Não é ele, não é o tal.» E isso proíbe-me sempre de amar.
(...)
Desnecessário observar a chama da minha vida na palma da minha mão, essa chama tão pálida como o espírito santo que fala muitas línguas das quais ninguém conhece o sigilo.
O sonho ficará de vigia. Desnecessário manter os olhos abertos. Agora os olhos são pedras preciosas, o cabelo um leque de rendas. O sono toma conta de mim."


Anais Nin
in Debaixo de uma Redoma


..pelo 34º aniversário da sua morte..

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

O caminho faz-se caminhando


O caminho é feito a andar. Talvez o Divino desça ao meu corpo, matéria que me prende, enquanto o caminho se cria por debaixo dos meus pés. Que tenha asas para voar quando a hora chegar, quando dos meus demónios me libertar.

Talvez comunicar com a mãe natureza para que ela me ofereça os seus instrumentos essenciais para construir, amuletos, em amor.. Saber distanciar-me o suficiente para poder olhar o outro sem máscaras ou orgulhos.

Decidi-me a colocar espelhos na noite, deixar de erguer os olhos e julgar os outros quando sei que tudo o que julgo é um reflexo de mim mesma.

Descobrir a unicidade do universo começa por entender que fazemos todos parte de um plano maior, que viemos a este mundo com um propósito, seja este qual for. É urgente descobrir o meu caminho, a minha essência. É urgente quebrar barreiras e carregar o mundo no olhar.. É urgente.. tudo o que deixamos para amanhã, apenas porque pode não haver amanhã, podemos estar perante um tempo único, onde a única coisa que interessa é o que estamos a Ser no momento. Esse momento, que só de se falar nele perde o sentido.

Equilíbrio interior, e a luta por alimentar as minhas raízes, fortificá-las para que o vento de ocasião não me sacuda da Terra.

A vida queima-nos a carne, e no seu florescer descobrem-se as feridas, as marcas.. quando o corpo arde que nem uma Fénix clamando o seu renascimento.

[in Agenda Lunarte 2011]


Semana de recomeços. Um novo ano, um novo ciclo lunar.
E assim chegamos à Lua da Gruta.
Recolhimento, encontrar o nosso lugar no centro do Ser.
Talvez a imagem do ventre da Mãe Terra.
Penso e repenso os planos que fiz.
Renovo energias e vontades.

Neste momento o criar [dar asas aos sonhos]
Irei fazê-lo através do sonho da estrela.
Descobrir o real sentido da minha assinatura cósmica.