segunda-feira, 22 de março de 2010

* Ostara


Fica assim, perdida algures no tempo, divagando nos seus pensamentos. Talvez fosse o seu desejo de se apaixonar, de um novo amor que ainda não tivesse sentido, que a levava a pensar naquele estranho. Desejava apenas poder olhar para ele mais uma vez, e sentir em si o mergulhar nos olhos dele, o domador de dragões, caminhante dos céus, erguendo a sua máscara, tocando a sua melodia..


A Primavera chega para nos fazer lembrar o que já esquecemos, o que vivemos e o que iremos ganhar..
Noite de Lua, uma das muitas noites de devaneio e de loucura em que dou por mim invadida pela dor de não saber onde dói. Suspiro, rezo à Lua, à Deusa, apanho flores perdidas no chão e faço delas minha companhia. Mas sempre em busca de algo que não encontro, talvez por não existir. Talvez seja eu quem mais me julga, mesmo sabendo que não tenho esse direito. Mas devo ter em mente que novos começos devem surgir, sendo eu repleta da subtileza do cisne, da sabedoria da Imperatriz, possuindo a sua força. Devo evitar cair nas teias da maldade e da arrogância, do ódio e do ciúme. Sentir a chama do conhecimento em mim e agarrá-la como uma luz que pode ferir quem não estiver preparado para a ver. Caminhando sozinha, mas sem deixar que a solidão me incomode, para enfim desvender os mistérios do Mundo, do Universo, das estações e dos elementos.
O Sol ilumina-nos os dias, a Lua reflecte-nos a sua luz durante as noites, mas ergue os seus véus de mistérios, sensualidade e paixão. É ela que representa a Divindade Feminina, o ventre de onde viemos, a nossa mãe, virgem e anciã. Deusa minha, ilumina-me o caminho com o teu manto de estrelas, as flores do caminho. Quero-me reflectida no que me cerca, descobrir no meu interior a verdadeira vida.


- Sabes Lucas, as emoções são cavalos selvagens.. - disse-lhe enquanto escutava o suave murmúrio da aurora - Há quem saiba domá-los, há quem tente apenas. E no fim a pergunta é sempre a mesma: Para quê?
- Para quê..? Para partilhar uma vida em vez da história de uma. Não sei... - respondeu ele suspirando - Cada vez me dói mais. Não fazer muito para mudar. Estranho...
- Talvez também não possas fazer nada para mudar.. Há coisas que só acontecem quando têm de acontecer.
- Se tivesse que te contar o que sinto neste momento ficaria perdido em palavras. Não sei o que me espera, este verdadeiro rodopio de emoções e situações. Esqueço-me de que deveria fazer algo por mim, pelo mundo talvez. Mas que posso eu fazer, se já tudo foi feito?
- Como é estranha a vida.. Tão efémera, e ao mesmo tempo tão longa. Há segundos que nos marcam para a vida inteira, que nos acompanham a cada passo. Erramos, pecamos, na urgência de tudo sentir. O mundo, a alma, o corpo..
- A solidão que preciso para conseguir ver mais claramente. Apenas porque para se ser santo tem de se morrer, e para morrer é preciso viver. - disse Lucas, fechando os olhos - Que eu nunca me esqueça do valor de cada dia, da luz e das trevas, pois encontram-se sempre presentes em mim. Que o Mundo alcance a paz, nesta época de sombras e esclarecimento.
- Que a minha passagem por esta Terra não seja nem mais nem menos que uma brisa de Verão ou o brilhar de uma estrela. Não tenciono deixar a minha marca no mundo como já grandes génios o fizeram. Sinto-me pequena demais para isso. Quero apenas o brilhar, viver cada dia como se fosse o primeiro, sabendo-o como o último.
- Só para dizer que és perfeita. - Lucas sussurrou-lhe ao ouvido - Transparente como a água para todos perdidos e corrompidos pelo tamanho conhecimento da intuição perversa. Impossível não amar.
O sol começava a rasgar o horizonte, e Miriam sentiu em si a enorme força da natureza, naquelas coisas simples. A simplicidade onde o Divino se esconde.
- Que as nossas batalhas não sejam em vão. - disse ela como que numa prece para a deusa da natureza.
- Nunca em vão...

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